Aconteceu como uma revelação coletiva: as organizações descobriram que tinham gerentes de mais. Usando a árvore hierárquica como mapa e sem muitas delongas, iniciaram a poda. Caía gerente para todo lado. Empresas novinhas em folha, traçando seu destino de unicórnio, nasceriam e cresceriam sem depender daqueles nós .
Há um século esse tipo de movimento seria impossível. Porque ninguém conhecia mais a empresa do que os gerentes. Aliás, era este o principal critério usado para justificar a ascensão ao posto: o domínio e a destreza para executar determinado trabalho. Patrick Hoverstadt coloca mais ou menos assim1: naquela época, 95% dos trabalhadores não conseguiam fazer o trabalho tão bem quanto o gerente; Hoje, 95% dos trabalhadores batem os gerentes. Deste entendimento até a poda, bastou a tesoura. Bye, bye, managers!
A Acme Alfa2 nasceu assim, managerless. Como Gabriela, cresceu assim e acha que vai ser sempre assim: sem gerentes nem hierarquia aparente. Os trabalhadores, de forma voluntária, participam de todas as decisões. TODAS, mesmo. É bonito de se ver. E difícil de mexer. E por que alguém mexeria, se é bonito e funciona? Porque a partir de certo tamanho a coisa toda — o sistema todo — emperrou. Vejamos a questão usando as lentes do VSM, o Modelo do Sistema Viável.
A falta de gerentes não significa a inexistência dos sistemas 2, 3, 4 e 5. Indica apenas que todos os integrantes do Sistema 1 — operação e gestão — participam dos demais sistemas. Lembre-se: no caso da Acme Alpha a participação nos outros sistemas é voluntária. Ninguém é obrigado a participar de nenhum comitê ou debate. No entanto, como é de se esperar, quanto mais crítica, sensível e abrangente a decisão, maior tende a ser o quórum. Quanto maior o quórum, menor a velocidade na tomada de decisão. Por outro lado, quanto maior o quórum, maior a probabilidade de uma boa decisão:
Repare, a partir de quinze participantes o aumento da probabilidade de uma boa decisão é praticamente irrisório3. Mas, por favor, não vamos confundir isso com uma eleição, por exemplo. Na eleição as opções estão dadas e você se limita a escolher uma delas para cada cargo ou questão. Eleições, assim como testes de múltipla escolha, reduzem a variedade. Em debates nós amplificamos a variedade antes de reduzi-la através de uma decisão tomada.
Cada componente do Sistema 1 — cada combinação horizontal de ambiente, operação e gestão — lida com uma variedade de potencial explosivo. Em certo momento, a Acme Alpha contava com sete times (Sistema 1) e cerca de quarenta trabalhadores distribuídos entre eles. Atenção: neste nível também não existe a figura do gerente. O que significa dizer que falta um filtro de variedade na horizontal. E quando todo mundo sobe para participar de uma decisão, acaba levando toda essa variedade junto. O Sistema 3, aquele que existe com a responsabilidade de enxergar e cuidar do todo, deixa de trabalhar apenas com a variedade residual. Aumentam os ruídos e distrações; Diminuem drasticamente a objetividade e a agilidade das decisões.
Se uma relativa morosidade é o preço a se pagar por uma democracia real, deve haver muita gente disposta a bancar. Mas ele não é o único. E nem o mais alto.
Imagine, por exemplo, o custo das decisões. Decisões monocráticas podem ser bem fraquinhas, como sugere o gráfico acima. Mas elas são relativamente baratas. Por outro lado, debates envolvendo 20 ou 30 pessoas custam bem caro. Quais decisões merecem tanto?
Um Sistema 2 bem desenhado, fixando padrões e regras, poupa bastante tempo e dinheiro. Por exemplo: limites para compras por indivíduos e times; processo para sugestão de pesquisas e treinamentos; fixação de quórum para processos de seleção e contratação; e por aí vai. Ajuda a resolver. Mas não elimina boa parte da carga pesada que segue batendo no Sistema 3. As decisões cruciais — aquelas que não são passíveis de padronização e automação — seguem subindo para lá. O que fazer?
Mais tarde, no boteco…
Te falei que vinha angu depois de tanto caroço teórico!
Então… mas ainda não me animei muito não. A lentidão inerente às decisões coletivas não é uma descoberta cibernética.
O Sistema 2 é! Assim como o quatro.
Hmm… não sei. Regras, padronização. Quem não faz isso?
Mas quem enxerga isso como um sistema único? O desenha e administra assim?
Desconheço… mas, precisa? Precisa ser assim?
Cara, pra quem trabalha com sistemas de informação num país como o nosso, um Sistema 2 bem desenhado seria um sonho! Você sabia que, olhando apenas para legislação tributária, temos três regras mudando por hora. Toda hora!?
Ele aprendeu isso no FAN… já tem uns 15 anos! Ou seja, a estatística dele deve tá pra lá de obsoleta…
Mudou alguma coisa de lá pra cá? Já temos os efeitos da reforma tributária? Ainda não… então, segue valendo “minha estatística”.
Peraí, peraí… o Sistema 2 não lida com legislação tributária!
Como não?
O Sistema 2 é um mecanismo regulador interno. Ele lida com indicadores e variáveis que estão sob total controle da empresa. A nossa bagunça tributária mora lá fora, no ambiente.
E quem lida com ela, com a bagunça?
Oras, quem lida com o ambiente. Sobra tudo para o Sistema 1.
Que escala tudo — contabilidade, livros fiscais etc. — para o Sistema 3. Santa variedade residual…
Nem sempre. Nem sempre ele escala…
Vocês dois fugiram totalmente do objetivo do post. Ele está falando sobre uma organização que não tem gerentes…
… e não chegou a lugar nenhum!
Nem vocês!
Se ele vier com a sugestão de contratar gerentes, eu pulo do barco…
Cotação
Não são necessários gênios para encerrar ou cortar coisas.
Em outra era, imaginei nomes absurdos para disfarçar os casos em estudo. Por não abusar o suficiente nem do absurdo nem do google, apareceram reclamantes. Imagina a saia justa. Por isso, em todos os estudos desta série nós veremos a mega corporação Acme. Os sobrenomes (Alpha, Beta etc) devem ter alguma utilidade.
Ah, esta não é a Acme que está sendo processada pelo Coyote.
Há ciência, mas não em quantidade suficiente para fazer desse gráfico uma ferramenta mais confiável e corriqueira. Eu o cito com relativa frequência porque minha confiança nesses números só faz crescer. Mas a minha experiência pode ser e é muito diferente da sua, que é diferente da experiência do Miller que estudou abelhas!?! Portanto: use com moderação e não dispense o pensar.
Management Não é o que Você Pensa, de Henry Mintzberg, Bruce Ahlstrand e Joseph Lampel (Bookman, 2011).