O VSM é uma ferramenta que orienta e facilita a aplicação da Cibernética em organizações sociais. O modelo geralmente é tratado como parte ou principal proposta da Cibernética Organizacional. São duas as principais utilidades do VSM: Desenhar organizações e Diagnosticar negócios ou instituições de qualquer natureza. Por ser um veículo da Cibernética, os domínios do VSM são o controle e a comunicação1.
CONTROLE
A palavra controle, infelizmente, é quase sempre confundida com coerção. É outro legado da mentalidade do comando e controle — da patologia que trato aqui como eficientismo. Controle, no sentido cibernético, é o que você exerce sobre o seu corpo, por exemplo. Prenda a respiração; Solte. Se você ignorar seus pulmões, eles sairão do controle? Vão parar de funcionar? Falaremos muito sobre controle e autonomia. Porque é preciso entender que não se trata de uma dicotomia.
O VSM é um diagrama de relações sociais e fluxos e transformações de informação que pode ser usado para garantir a maior liberdade possível dentro de formas organizadas de vida.
Princípios
Mais precisamente, Princípios Básicos de Design3. Ou seja, as ideias essenciais4 que guiaram o desenho do VSM. Por enquanto, ainda amadurecendo as opções5, vou apresentar dois princípios.
A Lei da Variedade Requerida (ou Lei de Ashby), incansavelmente citada neste finito, é o nosso ponto de partida. Ela diz que “só a variedade absorve variedade”. Vamos reforçar a ideia usando outros termos: só seremos viáveis, nós e nossas organizações, se a nossa complexidade (variedade) for suficiente para lidar com toda a complexidade que explode lá fora. O desenho de uma organização — seja ela pública ou privada, com ou sem fins lucrativos — fica comprometido quando ignoramos essa lei. Como coloca o inventor do VSM, Stafford Beer, é como se desenhássemos um avião fazendo vista grossa para a Lei da Gravidade. É grave assim. E não há um único dia em que os jornais não nos tragam diversos exemplos das consequências do nosso desconhecimento da Lei de Ashby.
Princípio da Recursão (ou Princípio Fractal6). Ele nos diz, simplesmente, que todo sistema viável contém sistemas viáveis e está contido em um sistema viável. Você é um sistema viável, assim como a sua família e, esperamos, a organização para a qual você trabalha. É viável todo e qualquer sistema capaz de se manter e prosperar de forma autônoma.
RECURSÃO
A recursão é a nossa principal (única?) alternativa quando o desafio é escalar. A natureza sabe disso há bilhões de anos. Como conceito e aplicações ainda não são triviais7, falaremos sobre isso, com calma, durante a série. Por enquanto, fixe exemplos: você, a empresa onde você trabalha, seu ramo de atividade, a economia do país, a saúde do mundo…
Eixos (ou Dimensões)
O VSM, quem diria?, é representado graficamente em duas dimensões. Se não fosse pelo seu jeitão recursivo, daria uma bela matriz 2x2. Brincadeirinha. Perdão, Beer!
Um negócio (operação) faz parte de um ambiente (nicho) e contém uma gestão. É o que nos diz o rabisco do lado esquerdo. Para facilitar leitura e entendimento, nós desacoplamos esses três elementos, o que nos dá o eixo horizontal do VSM. As setas (laços de fidbeque!) não nos deixam esquecer das trocas constantes entre ambiente e operação e entre esta e sua gestão.
O tamanho dos três elementos indica, de forma relativa, a variedade potencial8 de cada um. A variedade exposta pelo ambiente sempre será muito maior do que aquela presente na operação. E a variedade na operação sempre vai superar aquela da qual a gestão é capaz. É por isso que logo logo a gente vai conversar sobre Engenharia da Variedade. Antes, porém, precisamos explorar um pouco mais os três elementos:
Ambiente: abrange TODAS as partes interessadas naquele negócio (naquela operação) e também aquelas que são interessantes para ele. Moram aqui os clientes, fornecedores, concorrentes, órgãos reguladores, governos, sindicatos, ONGs etc. É importante não se esquecer que o ambiente também envolve os elementos passivos (ou seria melhor dizer não-humanos) do meio-ambiente.
Operação: a operação é o negócio ou entidade em estudo (pública ou privada, formal ou não, com ou sem fins lucrativos). Espera-se que ela esteja criando e entregando valor para alguém no ambiente. Este, por sua vez, a remunera de alguma maneira (além de entregar informação). Não se preocupe. Ainda temos um longo caminho pela frente na exploração deste e dos demais elementos do VSM.
Gestão: é a pequena parte da operação que só existe para garantir seu bom funcionamento e a sua viabilidade. Só!? Não se preocupe. Ainda temos…
Níveis (ou Sistemas)
Os retângulos e triângulos do rascunho acima representam os cinco níveis do VSM. Na realidade, usando a nomenclatura oficial, estamos falando dos cinco sistemas do VSM. Veremos em breve que muita gente boa tentou dar nomes para esses sistemas. E vamos entender porque é mais correto manter a nomenclatura original do Beer: Sistemas 1, 2, 3, 3*, 4 e 5. Simples assim.
Será um Curso por Email?
Acho ousado e um pouco constrangedor falar em cursos por email. Legado dos treinamentos por correspondência dos anos 1970-80? Pode ser.
No entanto, posso afirmar que esta série pretende apresentar o VSM, seus conceitos fundamentais, casos e sugestões de uso. Oportunamente, se o ambiente assim conspirar, podemos desenhar algumas interações práticas e síncronas. Uma oficina, talvez. Por enquanto, a única coisa que posso prometer são dois episódios por semana. O roteiro, de certa forma, está dado pelo próprio VSM. Com índice e tudo.
PRA QUÊ?
Para ganhar uma nova e poderosa maneira de enxergar, estudar, desenhar e curar organizações.
COM QUEM?
Contigo que, se chegou até aqui, deve se interessar por Pensamento Sistêmico, Design Organizacional, Cibernética, Administração, Empreendedorismo, Análise de Negócios, Arquitetura de Negócios, Desenvolvimento de Produtos…
Cotação
Não morda o meu dedo. Olhe para onde estou apontando!
Lembre-se: Norbert Wiener apresentou a Cibernética como sendo a ciência do “controle e comunicação no animal e na máquina”.
The Cybernetic Brain: Sketches of Another Future (University of Chicago Press, 2011).
Core Design Principles, ou CDPs. Surrupiei a ideia de Elinor ‘Lin’ Ostrom, sem me preocupar em saber se o conceito foi mesmo cunhado por ela. É surrupio de segunda mão, feito através de This View of Life, de David Sloan Wilson (Vintage, 2020).
Ideias essenciais são decisões que nos isentam de um sem número de outras decisões. CDPs representam esse tipo de decisão.
Confessei no post anterior que ainda tenho dúvidas quanto ao número de CDPs que guiaram Stafford Beer no desenho do VSM. Sei lá se viajo ao tentar combinar conceitos tão, como dizer?, anacrônicos?
Martin Pfiffner, em The Neurology of Business (Springer, 2022), fala em apenas um princípio (da Recursão). Difícil concordar com ele. Porque Beer não se cansa de citar a Lei de Ashby em todos os seus trabalhos sobre o VSM.
Patrick Hoverstadt, em The Grammar of Systems: From Order to Chaos & Back (SCiO, 2022), lista 33 princípios, leis e teoremas. É nesta lista que me baseio.
Termo usado por Hoverstadt na gramática citada acima.
Vide, por exemplo, as alternativas propostas para escalar o Ágil.
Cometo um erro com fins didáticos. Toda variedade é potencial: o número de estados que um sistema pode ter.