A zorra começou quando alguém cismou que a empresa precisava de um segundo sistema. Estava indo tudo muito bem com um Contas a Receber da vida. Mas o sucesso de hoje puxa o fracasso de amanhã, disse o sofrido poeta. E puxaram o segundo sistema; E descobriram a necessidade de integração entre sistemas; e inventaram uma nova indústria. Dali para os RDBs, ERPs, CRMs, EAIs, SOAs e APIs não foi um pulinho. Foram saltos acrobáticos que custaram e seguem custando bilhões ou trilhões ou mais — quem sabe?
O data-centric seria mais uma presença certa naquela sequência de siglas mal faladas se não fossem alguns detalhes:
Ele não depende de nenhuma nova tecnologia;
Ele não promove nenhum grande fornecedor;
Ele nos convida a virar a TI corporativa de cabeça para baixo. De verdade!
O Manifesto Centrado em Dados
Descobrimos a causa raiz da imensurável bagunça que caracteriza nossos sistemas e arquiteturas de informação: É a mentalidade predominante que prioriza as aplicações em detrimento dos dados. A solução é virar isso tudo de cabeça para baixo. Os dados são o centro do universo; aplicações são efêmeras1.
Os princípios-chave do manifesto centrado em dados são:
Os dados são um ativo fundamental de qualquer pessoa, organização e sociedade.
Os dados são autodescritivos e não dependem de uma aplicação para interpretação e significado.
Os dados são expressos em formatos abertos e não proprietários.
O acesso e a segurança dos dados são responsabilidade da camada de dados corporativos ou do cofre de dados pessoais e não são gerenciados pelos aplicativos.
Os aplicativos podem visitar os dados, realizar sua mágica e expressar os resultados de seu processo de volta à camada de dados.
Se você está pronto para considerar a possibilidade de que os sistemas possam ser mais do que uma ordem de grandeza mais baratos e mais flexíveis, então torne-se um signatário.
Lá se vão cinco anos desde que Dave McComb publicou Data-Centric Revolution2 e patrocinou ou motivou o Data-Centric Manifesto. A falta de barulho, eventos e certificados não é mau sinal3. E se pintarem dois ou três casos juramentados comprovando a realização da prometida redução de 90% nos custos e complexidades das mudanças será um deus-nos-acuda o próximo encontro de CIOs.
Esquece. Calma. Não vai acontecer. Não aqui. Não no curto ou médio prazos. Nem no longo, talvez. Como diz o próprio McComb, trata-se de “uma mudança profunda. Não é para todo mundo.”4
Data-centric significa, na prática, um único modelo de dados para toda a organização. “Simples e extensível”, completa McComb. Lá longe, no mundo ideal, esse modelo é também a base de dados. Porque, para arrepio dos analistas clássicos como este que aqui escreve, nesse mundo não há a distinção conceitual-lógico-físico5.
Um meio termo, não menos improvável, coloca esse modelo como uma camada entre as diversas bases de dados e as aplicações. Não me parece um sanduíche viável. Como petisco, pode virar aquela entrada que não acaba nunca. Saca aqueles puxadinhos de TI que deveriam durar apenas alguns meses e estão lá desde os tempos do Itamar? Então, é disso que estou falando.
O data-centric sério vai requerer papos muito sérios sobre ontologia e taxonomia. Tentarei ser breve (e sério) no próximo post.

Cotação
Em qualquer outro setor, reduzir em um milhão de vezes o custo de seus principais insumos reduziria significativamente o custo do produto final. O fato de o custo dos sistemas corporativos continuar subindo deveria nos fazer pensar se não estamos nos sabotando paulatinamente.
“Os dados são o centro do universo; aplicações são efêmeras!”
Pelos poderes de Grayskull!, isso parece bom demais para ser verdade.
DBAs do mundo, uni-vos! Há luz lá do outro lado daquele lake.
The Data-Centric Revolution: Restoring Sanity to Enterprise Information Systems (Technics, 2019).
McComb prometeu outros dois livros para nos ensinar a desenhar e implantar uma arquitetura centrada em dados. Está devendo.
Mas fala baixinho, por favor.
Ah, mas eu ficaria bem puto se eu fosse um CIO ou CTO e alguém me escanteasse assim.
E lá se vai mais uma cascata…